História dos Números Complexos
Período: 1545 A 1572 d.C.
Assuntos matemáticos envolvidos:
• Álgebra: números complexos; equações cúbicas e quadráticas
• Análise: números imaginários
O fato de que um número negativo não tem raiz quadrada parece ter sido sempre claro para os matemáticos que se depararam com a questão.
As equações de segundo grau apareceram na matemática já nas tabuletas de argila da Suméria, aproximadamente 1700 anos antes de Cristo e,
ocasionalmente, levaram a radicais de números negativos; porém, não foram elas, em momento algum, que sugeriram o uso de números complexos.
A rigor, uma equação era vista como a formulação matemática de um problema concreto; assim, se no processo de resolução aparecia uma raiz quadrada de um número negativo, isto era interpretado apenas como uma indicação de que o problema originalmente proposto não tinha solução. Como veremos neste capítulo, foram só as equações de terceiro grau que impuseram a necessidade de trabalhar com estes números.
Vejamos inicialmente alguns antecedentes. Um primeiro exemplo desta atitude aparece na Arithmetica de Diophanto. Aproximadamente no ano de 275 d.c. ele considera o seguinte problema:
Um triângulo retângulo tem área igual a 7 e seu perímetro é de 12 unidades. Encontre o comprimento dos seus lados.
Chamando x e y o comprimento dos catetos desse triângulo temos, na nossa notação atual:
.
Substituindo y em função de x obtemos a equação:
,
cujas raízes são:
.
Neste ponto Diophanto observa que só poderia haver solução se o que implica, obviamente, que não existe o triângulo procurado. Neste contexto, é claro que não há necessidade alguma de introduzir um sentido para a expressão .
Outras referências à questão aparecem na matemática indiana. Aproximadamente no ano 850 d.c., o matemático indiano Mahavira afirma:
... como na natureza das coisas um negativo não é um quadrado, ele não tem portanto raiz quadrada.
Já no século XII o famoso matemático Bhaskara (1114-1185 aprox.) escreve:
O quadrado de um positivo é positivo; e a raiz quadrada de um positivo é dupla: positiva e negativa. Não há raiz quadrada de um negativo; pois ele não é um quadrado.
Também na matemática européia aparecem observações desta natureza, Luca Paccioli, na sua Summa di Arithmetica Geometria, publicada em 1494, escreve que a equação é solúvel somente se e o matemático francês Nicolas Chuquet (1445-1500 aprox.) faz observações semelhantes sobre ``soluções impossíveis'' num manuscrito não publicado de 1484.
Desde que os babilônios descobriram a forma de resolver equações quadráticas, se passaram mais de 3000 anos até a descoberta da fórmula que da as raízes das equações de terceiro grau por Del Ferro, Cardano e Tartaglia no início do século XVI. Dada a equação , a fórmula de Cardano-Tartaglia que permite obter uma raiz é:
.
Esta fórmula, junto com o método de resolução das equações de quarto grau, foi dada a público em 1545, no Ars Magna, de Cardano. A publicação desta obra deu um novo impulso ao estudo da álgebra.
É claro que quando a fórmula parece não ter sentido: porém, mesmo neste caso, a equação pode ter solução.
Em 1575, um outro algebrista italiano chamado Raphael Bombelli publicou um livro chamado Álgebra em que descreve as idéias de Cardano de forma didática. é precisamente neste livro onde aparece pela primeira vez a necessidade explícita de introduzir os números complexos e também uma primeira apresentação do assunto.
Ao aplicar a fórmula acima ao exemplo , Bombelli obtém:
,
mas é facil perceber diretamente que é uma solução desta equação.
Bombelli decidiu trabalhar como se raízes quadradas de números negativos fossem verdadeiros números. Ele concebe que a raiz cúbica de pode ser um ``número'' da mesma forma, isto é, do tipo . Talvez, a raiz cúbica de seja da forma . Neste caso, ter-se-ia que , donde é fácil deduzir que . Assumindo que se aplicam a estes números as regras usuais dos cálculos algébricos não foi difícil descobrir que e verificar que, de fato,
.
Bombelli percebeu claramente a importância deste achado. Ele diz:
Eu achei uma espécie de raiz cúbica muito diferente das outras, que aparece no capítulo sobre o cubo igual a uma quantidade e um número. ... A princípio, a coisa toda me pareceu mais baseada em sofismas que na verdade, mas eu procurei até que achei uma prova.
O caso em que , era chamado na época de casus irreducibilis porque qualquer tentatica de calcular de fato o valor da incógnita pela fórmula de Cardano-Tartaglia, sem conhece-lo antecipadamente leva, de novo, à equação de terceiro grau original. Porém, este era, em certo sentido, o mais importante de todos, pois é justamente o caso em que a equação considerada tem três raízes reais.
Faremos aqui um pequeno resumo da evolução dos números complexos, para que o leitor tenha uma visão global da história do assunto.
• O símbolo foi introduzido em 1629 por Albert Girard.
• O símbolo i foi usado pela primeira vez para representar por Leonhard Euler em 1777, apareceu impresso pela primeira vez em 1794 e se tornou amplamente aceito após seu uso por Gauss em 1801.
• Os termos real e imaginário foram empregados pela primeira vez por René Descartes em 1637.
• A expressão número complexo foi introduzida por Carl Friederich Gauss em 1832.
• A representaçãp gráfica dos números complexos foi obtida independentemente por Caspar Wessel, em 1799; Jean-Robert Argand, em 1822 e Carl Friederich Gauss, em 1831.
• A apresentação hoje usual dos números complexos como pares ordenados de números reais foi dada por Sir William Rowan Hamilton em 1837.
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